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ENTREVISTA – HÉRCULES FRANCO: DUBLADOR DO CÉREBRO, BOJACK E MAIS

ANMTV / Divulgação
O ANMTV bateu um papo com o dublador Hércules Franco, que atua na profissão há quase 30 anos, e já emprestou a sua voz a conhecidos personagens de animações como o Cérebro (Pinky e o Cérebro), Número 1 (KND – A Turma do Bairro), o robô I.R (Corrector Yui), e atualmente dubla Bojack, o protagonista de BoJack Horseman, série animada original da Netflix.
Também é um importante diretor de dublagem, sendo responsável pelas versões dos primeiros desenhos do Cartoon. Atualmente dirige longa-metragens na Delart, o maior estúdio de dublagem da América Latina. Confira abaixo a entrevista cedida pelo dublador ao nosso repórter Kevin Bueno:

Olá, Hércules. Obrigado por topar conceder essa entrevista ao ANMTV.
Eu que agradeço o convite.

Conte-nos um pouco sobre a sua carreira de dublador.
Já tem tanto tempo. Aconteceu por acaso. Vi um cartaz na minha escola de teatro, anos depois de formado, escrito “curso de dublagem com Newton da Matta, dublador do Bruce Willis”. Eu não sabia o que era dublagem, mas era tão fã do Bruce Willis que quis conhecer o seu dublador. E o resto é história, isso foi há 29 anos. Fui imediatamente contratado pela Herbert Richers, e aí começou essa carreira na qual sou viciado até hoje.

Qual personagem seu você considera mais marcante?
Quando eu tinha pouco tempo de dublagem, o primeiro a fazer sucesso foi o Cérebro, do Pinky e Cérebro, foi estrondoso. Até hoje eu tenho pessoas que me dizem “você é a voz da minha infância“. Isso é muito legal de escutar.

Como você iniciou na direção de dublagens?
Eu vinha sendo convidado pelas grandes empresas, como a Herbert e a extinta VTI. E logo a seguir, eu recebi um convite da Cinevídeo, que era uma empresa pequena. Lá, eu achei que podia fazer diferença, e não ser mais um das dezenas de diretores das grandes empresas, e aceitei. Acho que eu acertei.

Por quais outras casas você passou?
Houve um período onde eu dirigi ao mesmo tempo na Cinevídeo e na extinta Dublamix. Acumulei durante vários anos a direção nas duas empresas, era um trabalho insano. Eu passava minhas madrugadas assistindo aos filmes que ia dirigir. Depois eu resolvi dar um tempo e não trabalhar durante um ano. Não aguentava, fui fazer outras coisas. Após esse período, eu aceitei dirigir na Wan Macher. Depois eu falei que ia dar mais um tempo, porque direção é exaustivo. Mas aí fui convidado pela Delart. E aceitei dirigir lá, que é uma empresa de alto nível, talvez a melhor do Brasil. Dirigi muitas séries, muitos longas, até que cansei de novo. Atualmente eu só dirijo algumas produções lá, meia dúzia de longas por ano.

Você dirigiu as dublagens dos primeiros desenhos originais do Cartoon Network. Como foi a experiência?
Foi muito legal. O Cartoon Network estava entrando no Brasil, nós tínhamos mais autonomia do que temos hoje. Então eu pude escalar esse elenco todo, não houve teste, nem pressão nenhuma. E foi muito bacana, porque foram desenhos que fizeram muito sucesso. Até hoje, esses colegas que fizeram aqueles desenhos são conhecidos, como a Miriam Ficher é conhecida pela Vaca, o Clécio Souto pelo Frango. O Ricardo Juarez talvez tenha seu maior sucesso como Johnny BravoAs Meninas Superpoderosas também foram um sucesso maravilhoso. E o Dexter acho que era o meu favorito. Eu me divertia muito dirigindo aquilo. O José Luiz Barbeito, que já faleceu, e a Carmen Sheila eram sensacionais. A Sheilinha fazia maravilhas com a irmã do Dexter. Foi uma época muito boa, me lembro com muita alegria desses projetos.

Como surgiu a oportunidade de dublar o Bojack? Você se identifica com o personagem em algum aspecto?
Olha, isso foi convite pra teste. É um trabalho muito difícil, por questões de sincronismo. Dublar um cavalo, com uma boca imensa, com tantos dentes. A dificuldade maior eu acho que é o próprio contexto do desenho, que trabalha com o mundo das celebridades de Los Angeles. Tem muitas piadas muitos difíceis de adaptar. Mas eu morro de rir com ele. Se eu me identifico em algum aspecto, não sei. Ele é deprimido, é um cara decadente, ele fez sucesso. Eu nunca fiz sucesso, então não sei o que é entrar em ostracismo. Mas tem um lado muito bacana, ele é generoso, nesse lado eu me identifico. Ele busca uma ética nesse mundo anti-ético que ele vive. E eu gosto muito de trabalhar com a Marcia Coutinho, que é uma excelente diretora.

Qual a diferença entre dublar animação japonesa e ocidental?
Olha, pra mim é bem mais difícil dublar um idioma asiático. Porque como você não domina o idioma, você tenta fazer a leitura do personagem por outras coisas. Você tenta ver o contexto, as expressões. Você às vezes não sabe se o cara tá sendo sincero, ou ardiloso, se ele tá sendo irônico. Algumas coisinhas você perde. O japonês é muito gritado, muito lá em cima, e você não pode fazer assim, senão fica caricato em português. Eu acho o desenho japonês bem mais difícil de dublar. Mas é divertido.

Teve alguma série ou filme que você não gostou de dublar ou dirigir?
Inúmeras coisas. Eu sou diretor, gosto muito de dirigir. E um dos atributos do diretor é escalar elenco. E 80% do sucesso da dublagem depende da escalação. E muitas vezes eu sou escalado para papeis para os quais eu não escalaria. Que tem vários colegas que fariam melhor do que eu. Então eu me sinto às vezes numa saia justa. Às vezes eu penso “Isso é pro Ricardo Schnetzer“. E inconscientemente eu vou buscar inspiração no Schnetzer. E também teve projetos que eu dirigi que eu passei adiante. Inclusive séries de sucesso. Eu fiz isso com Gossip Girl por exemplo. Uma hora me cansou aquele universo de milionários nova-iorquinos.

O que você acha das mudanças que o mercado de dublagem vem sofrendo nos últimos anos?
Faz parte do processo de evolução. Ficou mais fácil você ter uma empresa de dublagem, antigamente você tinha que criar praticamente uma fábrica. Por isso que havia poucas quando comecei. Os custos hoje são bem menores. A tecnologia facilita em vários níveis. E isso às vezes gera preocupações. Novas plataformas, novas mídias foram criadas e você tem que atender a isso. Isso às vezes causa uma certa desorganização na categoria. Nós temos acordos coletivos de trabalho, às vezes algumas praças novas os desrespeitam e vem uma concorrência desleal. Se abre empresas pequenas, com um custo de manutenção bem menor que uma empresa maior. Às vezes os distribuidores não querem qualidade, querem preço e prazo. Isso acaba jogando a qualidade da dublagem pra baixo. E sobre essas mudanças, a gente tem que se adaptar. As tecnologias estão aí, sofreram mudanças rapidamente e nós temos que estar aptos à adaptação.

Qual conselho você dá para aqueles que vocês querem se tornar dubladores?
Você vai ter que correr atrás, ralar muito. O mercado está sempre precisando de bons profissionais. Se você for bom, você será bem-vindo, o mercado vai tomar conhecimento da sua existência e você vai ganhar espaço. O conselho que eu daria é o que eu daria para quem quer ingressar em qualquer profissão. Se você fez a opção, é essa mesma que você quer, vá à luta. Se prepare.

Que mensagem você gostaria de deixar para os nossos leitores?
A gente precisa muito do público, mais do que nunca. Com o advento das mídias sociais, há um contato mais próximo do fã de dublagem com o profissional. A gente hoje precisa muito da cooperação dos fãs para que a dublagem mantenha a boa qualidade. Com o surgimento dos novos estúdios, e a questão de preço e prazo, a dublagem caiu de qualidade. Às vezes eu vejo trabalhos quase que amadores. Então a mensagem que eu deixo para os leitores é: Prestigiem a boa dublagem. E denunciem a dublagem ruim.

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